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terça-feira, 31 de janeiro de 2017

Levando Cor A Guerra


Acabei de terminar de ler o livro da Eva Weaver. "O menino dos fantoches de Varsóvia". E achei simplesmente fantástico. Muitas vezes, no decorrer da leitura, a conotação das frases, muito bem construídas, me faziam recordar a linguagem de Zusak, em "A menina que roubava livros",  mas isso não se dá em nada pela interligação do tema que é claro, aborda como pano de fundo as imagens do holocausto. Mas sim, pela forma incrível como ela  abusa em sua poesia lírica para nos reportar os acontecimentos, temperando os capítulos com os elementos racionados (as famosas rações) que a barbárie da guerra oferecia aos inanimados judeus no gueto da Varsóvia. As cores pobres que pintavam o ambiente sufocado em que se escondiam esperando resolutamente por algum traço de liberdade vã, em muitos momentos mágicos nos fez encher a memória pelo contraste absoluto do arco-ires de pequenos olhinhos fantasiosos extasiantes que meneados há mãos ágeis por onde andavam - os fantoches -espantavam por breves momentos a angústia antes presente o tempo todo. E como esquecer o medo que nos acompanha a cada passo dado por Mika em direção a escuridão do muro a carregar em seu próprio peito um pacote tão delicado, sem sentir na mesma consonância a respiração serena de Hanna adormecida no interior de seu casaco. O que falar da desilusão de Ellie quando resolveu ficar para trás sem qualquer expectativa.  Como não se emocionar com o soldado Max recolhendo cada pedacinho estilhaçado da fotografia de Erna e Karl espalhados pelo chão da gélida Sibéria. Tendo como confidente um príncipe que dorme escondido no interior de sua camisa. Isso antes de paralisar diante do uivo dos lobos, no meio da floresta escura. Sentir a dor congelante em seus pés no meio do nada, perseguindo o tudo que ficou para trás. É preciso confessar, que as vezes bateu uma certa agonia para chegar logo ao fim da história, diferente quando falamos de enredos mais leves, que você teme chegar no final tamanho o apego que fica aos personagens, mas isso não é por falta de apego, muito pelo contrário, o carinho por cada um deles - e no fim isso acontece até mesmo com os soldados alemães, principais causadores dessa fenda - que por compaixão tudo que quer é que acabe logo o sofrimento de todos eles, afinal por si só o tema já causa um certo desconforto. Mas a verdade é que valeu muito a pena cada uma das quase quatrocentas páginas narradas brilhantemente por essa escritora, que andei pesquisando e ainda não possui outros livros - uma pena - mas esperemos que ela não pare apenas por aqui.  

site oficial da autora link abaixo:
http://www.evaweaver.com/Writer/Author.html



sexta-feira, 27 de janeiro de 2017

A Pretensa Ilusão de Conduzir Bem Um Machado 


Ah, as narrativas que ficaram aportadas no tempo passado. A falta de se poder nutrir dentro da beleza que encanta nessa linguagem quase incauta, não fossem pelos arroubos que causam, penetrando bem fundo no valor íntimo dos nossos anseios, nos fazendo saborear cada parágrafo, uma, duas ou mais vezes, pelo simples afeto de ter de novo, a mesma sensação de estar brindando com esses mesmos versos, uma segunda chance de existir. Ou de coexistir, não em suas estórias, por si muito bem construídas, nem corroborando com vossos personagens em afeto, como aos de Austen, mas sim na triste ilusão de plainar com essa língua, tão pura, imensamente rica, que vai gotejando por meio de passagens insípidas da realeza do passado, transbordando de dentro para fora, como de um ventre para o nosso mundo. Aquela "coisa" que você só sente quando está encantado. O amor de ler, sob a esfera dos cortes certeiros que só um bom machado tem a capacidade de fazer. Hoje podendo meditar melhor, as escolhas feitas, o único arrependimento é o de não ter tido a obrigação de ter entrado em contato com muito mais machados cortantes e de estar mais íntima d'Eça e daquelas histórias contadas com todo aquele apreço singular, que apenas possuíam aqueles que o faziam pelo simples prazer de mostrar um novo perspectivo de um mesmo mundo em que todos estavam vivendo. Não a mesmice, da mesma coisa de todos os dias, nem a melação a que se apregoam as novas empreitadas, menos ainda a prerrogativa das novas ciladas contempladas dos novos tempos. O amor ficou para trás. O símbolo da anarquia sexual, tomou conta de vez, do nosso mercado editorial. Culpar os adeptos desses novos campos? Julgar a decência humana? fantasiar com um mundo mais humano e menos senil? Esse é o mundo mais humano, a que muitos tem se referido e ninguém ainda havia se apercebido de fato do que se tratava. As pessoas querem um mundo mais humano, pois eis que aí o está. Nosso universo como ele é, como as pessoas queriam que ele fosse, mais humano. Porém, não humanizado. Pois para adentrarmos mesmo num estado contemplativo de submersão humanizado, não devemos mais querer ser humanos.  Mas sim pessoas menos humanas e mais ideais. Pessoas mais inspiradas nas lições divinas, angelicais. Menos humanas, pois ser humano é ser normal. É errar todo os dias, mesmo procurando acertar o passo. Agora, buscar ser mais corretos como deuses, senhores de adoração universal, como os santos, feito Assis, isso sim, é uma luta quase inalcançável. O que não quer dizer que devemos parar de lutar. 

Na coluna da querida Fernanda Torres, na Folha de SP, li sobre o novo livro de Silviano Santiago, "Machado". Já não fosse pela satisfação de ler as suas palavras sempre tão ambiguamente transversal, me deu muito mais prazer essa em especial. A forma como ela narra a essência do romance de Santiago, faz não apenas criar expectativas no seu tributo a Machado de Assis, como também a nos inspirar a buscar cada vez mais a leitura nesse horizonte norteador de ideias palpáveis.  
Provavelmente jamais escreveremos como Machado, ilustrando as pilastras que conduzem às ruas, nem tampouco como Queirós, às salas nervosamente privativas ilustradas por vestidos de veludo azul e dorso desnudo. Mas temos ainda a chance de podermos morrer desesperadamente tentando. Tentando construir um mundo onde a burocracia não corrompa a verdadeira arte da escrita. Onde o assombro dos nossos medos não caia na certeza de que esses célebres imortais, tenham ficado apenas no passado. Com a sua linguagem fina, em meio a tantas línguas hoje faladas sem rumo algum. 




quinta-feira, 19 de janeiro de 2017

Todos os dias são mesmo assim    


Recebo flores coloridas que enfeitam a minha memória e tento guardar essa imagem pelo resto do dia. 
O look perfeito está na palma das mãos, não é necessário nem abrir o armários para ter certeza do que vou vestir sabendo que vou estar arrasando. 
Bebo pelo menos um copo bem grande de água que vem de fontes límpidas que preservam o saber. 
Banho-me nas mais incríveis cachoeiras que renovam meu semblante diário quando derramam sua água cristalina, preservadas pelo tempo, paisagens nas quais talvez eu jamais vá efetivamente pisar. Ainda bem que há essa fonte inesgotável de imaginação. 
Trilhas áridas, arborizadas, fazem parte dos caminhos que escolhi seguir e que me encantam, com sua naturaleza, antes mesmo do café. 
Mares tão azuis que convidam para um mergulho ao lado dos peixes.
Barcos, lanchas, lagos. Neve árvores, cactos. 
Arte estampada em porcelana dentro de uma máquina de lavar pratos, outra grafitada espetacularmente embaixo de uma ponte. Na primeira antigos presidentes americanos, na sequência uma mulher de cabelo azul e expressão que lembra vagamente uma Thérèse de Picasso, compactuada a atualidade hegemônica do concreto envolvida em muito mais cor. 
Placas que indicam destinos. 
Música que fala sobre um estado de espírito tão down. 
Pássaros gulosos repousados em galhos cobertos por musgo.
Luminárias em forma de sinos e janelas equilibradas que recebem toda luz possível dentro de um cômodo só. 
Jogos reprises testando a capacidade de saber. 
Cores e matizes, muitas, muitas cores. 
A simplicidade e a extravagância. 
Animais curtindo o fim de tarde e seu reflexo espelhado no lago. 
Pedras, crianças dormindo, bibliotecas.
Ondas gigantescas que parecem engolir o fôlego de quem as vê.
Até se deparar com outro banco na soleira de uma cabana a beira de um lago convidando para um descanso. 
Modelos de beleza indiscutível.
O sol nascendo como em nenhum outro lugar se poderia ver captado com essa mesma magia.
Posições que demonstram do que um ser humano é capaz. 
De fazer absolutamente qualquer coisa aqui no alcance da Terra. 
E os milagres... bem esses deixemos para alguém com mais experiência que tem uma visão melhor de tudo e todos. 
Visão do nascer do sol a visão noturna, mesmo assim tão repleta de tanta luz. 
Bolas em cor de fogo que sobem enchem os olhos e a paisagem cinza de beleza. 
Um salva vidas de alguém que anda de coleira.
Uma roupa que parece ter sido feita exatamente para aquele cenário, ou seria o contrário?
Gente sentada na ponta de um prédio. 
Poesia que cabe em qualquer coração, até nos pequenos. 
Arte estranha versus arquitetura singular. 
Boinas parisienses em cabeças de moças russas. 
Chinelos a espera do seu dono. 
Olhares intrigantes.
Cascalho, madeira e roedores.
Videos que sorriem por si mesmos, lápis, corações e canções. 
Neve, agasalhos, furações. Sol, areia, horizontes azulados. 
Jóias, pele, faces intrigadas. 
Carros antigos, sapatos de couro, flor no cabelo. 
O vento que fez as folhas irem parar penduradas às orelhas. Tudo isso e muito mais... Em apenas alguns minutos...